Não tenho filosofia. Eu tenho poesia

Só lembranças

Talvez por se falar em saudade ontem. Talvez por causa de um sonho perturbador. Talvez por uma lembrança qualquer. Talvez por olhar para trás e, de repente, ser possível se lembrar de um cheiro, de um olhar, mesmo não havendo vontade de voltar, algo ali, naquele quando, ficara perdido e sem explicação. Coisas de seres humanos, racionais, pessoas. E o passado, que nesta dimensão não é dobrável, vai envelhecendo, ficando entre brumas, enevoado. As pessoas vão desaparecendo como que por mágica, falecem para nossa realidade. Falecem junto com certos pedaços que levaram de nós. E, às vezes, gostaríamos que, nem que fosse um instante, aquele segundo, aquela esquina, aquele beijo, aquela conversa pudesse se tornar real novamente. Só aquele momento. Sem antes, nem depois. Sem explicação, como tanta coisa nos acontece na vida.
Isso é sentir saudade? A palavra indecifrável... o sentimento intraduzível...
É assim que nascem os poemas? Isso é o viver?
A saudade é um sentimento dolorido, porém, bom. Tem gosto de valeu a pena e faria o mesmo novamente.



O que é o passado? Já se foi.
Acabou.

Toco sua imagem flácida entre as brumas das minhas lembranças
Faço uma lista dos mil olhares que lançaste para mim;
Ontem eu sonhei contigo.
Uma lista para meu coração se arranhar no estreito
De tuas palavras silenciosas.

Tudo bem, eu destruí tudo.
Foste covarde o bastante para resistir à paixão
Ou corajoso...
Teu olhar decadente me dava esperanças
De um mundo bonito por trás da névoa de toda descrença.

Hoje eu sei que sempre tive esperanças,
Elas eram minhas, teu olhar decadente jamais deixara de ser
Decadente.

Mas as lembranças... acaso um túnel que dobra o tempo
E nos faz retornar ao passado?
Meu coração ainda acelera.
Lembro-me perfeitamente do teu cheiro.

Não me pergunto mais “por quê”.
Apenas sinto.
Tudo bem, não destruí nada.
Foste corajoso o bastante para resistir à paixão
Ou covarde...

São só lembranças.
Do teu olhar caído sobre meu corpo quente
Do teu olhar destemido pelas ruas desconhecidas
Do teu olhar negro rangendo contra a realidade
Do teu olhar ansioso enquanto partíamos
Do teu olhar covarde... gelado...
Enquanto me partia ao meio.

Só lembranças entre as brumas do meu desespero.
por Elayne Amorim

Nenhum comentário: