Não tenho filosofia. Eu tenho poesia

Arte da palavra...


Conheci Caio Fernando Abreu através de um conto que uma professora me emprestou pra eu ler, “Aqueles dois”. Naquele instante percebi que entrava em contato com uma grande literatura através de um grande autor. Daí pra frente, comecei a procurar mais textos dele e – não por acaso – em blogs que leio vejo bastantes citações de sua obra. O que mais me chama a atenção é sua capacidade de traduzir o intraduzível, as angústias humanas, internas, inerentes a qualquer ser humano. Seus textos despem-se de pudores, de hipocrisias, e revela a alma humana, com suas contradições, suas dores, suas expectativas, sensações...
Isso é Literatura: tentar traduzir o intraduzível. Despir. Revelar. Tocar nosso íntimo tão soterrado em meio a modernidades materiais, em meio a máscaras em que disfarçamos nossos sentimentos, nossos anseios, adequando-nos a padrões quem nem sempre (quase nunca) nos faz realmente felizes... Isso é Literatura, a Arte da palavra...
Aí vão trechos da obra de Caio F Abreu que li e gostei...

... o outro talvez perguntaria por que infelizmente? então dirás rápido, para não te desviares demasiado do que estabeleceste, qualquer coisa como seria tão bom se pudéssemos nos relacionar sem que nenhum dos dois esperasse absolutamente nada, mas, infelizmente, insistirás, infelizmente nós, a gente, as pessoas, têm, temos – emoções. Meditarias: as pessoas falam coisas, e por trás do que elas falam há o que sentem, e por trás do que sentem há o que são e nem sempre se mostra. Há os níveis não formulados, camadas imperceptíveis, fantasias que nem sempre controlamos, expectativas que quase nunca se cumprem e sobretudo, como dizias, emoções.
(Natureza Viva)

A: Eu vejo. Eu quero.
B: O quê?
A: Que você seja meu companheiro.
B: Hein?
A: Eu quero que você seja meu companheiro, eu disse.
B: Você disse?
A: Eu disse?
(Diálogo)

Não chegaram a usar palavras como especial, diferente ou qualquer outra assim. Apesar de, sem efusões, terem se reconhecido no primeiro segundo do primeiro minuto. Acontece, porém, que não tinham preparo para dar nome às emoções, nem mesmo para tentar entendê-las.
(Aqueles dois)
- Só se pode encher um vaso até a borda. Nem uma gota a mais.
(Uma história de borboletas)

Mas se eu tivesse ficado, teria sido diferente? Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o fim, quando se sabe que doerá muito mais -por que ir em frente? Não há sentido: melhor escapar deixando uma lembrança qualquer, lenço esquecido numa gaveta, camisa jogada na cadeira, uma fotografia –qualquer coisa que depois de muito tempo a gente possa olhar e sorrir, mesmo sem saber por quê. Melhor do que não sobrar nada, e que esse nada seja áspero como um tempo perdido.

"Essa morte constante das coisas é o que mais dói"

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