Todos os dias, de alguma forma,
encontro Deus. Não é que sejam uns dias mais, outros dias menos; é que, de
alguma forma, afasto-me dEle há momentos. Paradoxo total saber que dEle me
afasto mesmo sabendo que Ele não se afasta de mim em nenhum momento. Penso que
talvez seja como aqueles amigos que amamos e, por diversas razões, nos
afastamos, mesmo a sabermos que continuam ali, do nosso lado.
Não sei qual a vantagem em se matar
Deus. Vejo tantas pessoas, tantos jovens, sem fé. Sem fé em nada, sem
esperança, sem perspectiva, como se vivessem por viver, sem ao menos olhar para
si mesmo com um mínimo de amor. Falar em amor ao próximo torna-se então mais
distante.
Que a vida não é fácil, disso nós já
sabemos. Ela é um caminho desconhecido, com paradas possíveis e fatos, por
vezes, previsíveis, dependendo das nossas escolhas. Dentre tantas filosofias e
oportunidades, nós e apenas nós mesmos é que podemos escolher nossos caminhos. Não
sei se abandonar Deus é o melhor. Porque Deus, também e inclusive, é razão. Uma
razão guiada pela fé, como se duas coisas inconciliáveis fossem possíveis. Para
mim são.
O pior é que não se anda apenas
matando-se Deus, ao matar Deus mata-se a si próprio. O vazio, o tédio, o nada
andam se instalando por aí. A palavra amor
já nem sei que conotações assume. Respeito. Fé.
A fé é maravilhosa. Acreditar. Acreditar
naquilo que só dá para sentir. Simplesmente acreditar. Retirar uma força não se
sabe de onde nos momentos difíceis. Transcender mesmo no caos. Alcançar uma
dimensão muito além da compreensão ínfima daquilo que (achamos) que sabemos.
Talvez Deus seja mesmo aquele homem de
barba, aquela luz ofuscante, uma energia inalcansável pelos olhos humanos. Talvez
Deus esteja, inexplicavelmente, naquela pessoa que mais nos aborrece. Talvez Ele
esteja em cada mínimo átomo que compõe a natureza. Esteja dentro de nós –
inexplicável. Então matá-lO seria matar a nós mesmos.
Parece que tudo está tão ruim, as
pessoas perderam a noção e, às vezes, não faz sentido sair de casa para
trabalhar. Nada faz sentido. E sem um sentido fica difícil viver. Não creio que
Deus seja para ser encontrado na hora da morte, mas seja para ser encontrado a
todo instante. Encontrá-lO é como encontrar a nós mesmos.
Acredito que Deus seja incompreendido,
como as próprias palavras de Cristo foram incompreendidas e receio, até hoje,
em grande parte, continuem incompreendidas. E tantos outros – grandes homens ou
mulheres – que foram incompreendidos em seus feitos, em suas ideias, em suas
loucuras.
Se Deus fosse o ópio, não acho ser
isso tão ruim, como a beleza, a poesia, a própria vida em todo seu completo
mistério, também são ópios. Um ópio que não matasse, mas que fizesse viver, que
fizesse querer viver.
Quais as vantagens de se matar Deus? Quando
olho olhos vazios a me olharem, a olharem o nada como se procurassem algo no
meio do nada que se instala, não encontro mesmo, nem uma resposta. A pessoa que
crê, às vezes, é ridicularizada, afastada. Oh, não sabem o que fazem, porque dentro
de suas cascas duras também há turbulências que nem uma religião, nem uma
droga, nem uma pessoa, nem uma filosofia, nem um vazio irá retirar ou acalmar. As
pessoas não deveriam ter vergonha de manifestar sua fé – falo de fé, não falo
de religião nem muito menos “a minha igreja é melhor que a sua”, isso é
absurdo.
Falo de uma das manifestações humanas
mais complexas e lindas que é a fé. Não sei se matar Deus é o melhor caminho. Ele
simplesmente existe, acreditemos ou não – não é apenas um substantivo concreto,
é o tudo que não vemos em tudo que vemos todos os dias. Sem Ele, o pavor e o
desespero humanos não têm fim.
Como não acreditar nEle? Vejo Seu
infinito deslumbrada nas próprias criações de minhas palavras. Deus é criação. E
mesmo das formas mais bizarras podemos encontrá-lO, se permitirmos. Deus é
poesia. Deus é música. Deus é beleza. Deus é galope. Deus é emoção. Deus é vida
e o que destrói a vida certamente não é Deus. Deus é este lindo céu azul de
outono.
Deus simplesmente é. Matá-lO
certamente não leva a soluções.
por Elayne Amorim
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