Não tenho filosofia. Eu tenho poesia

Descompromisso humano

Sabe qual é o meu compromisso com a humanidade?
Nenhum.
Tenho água, tenho comida, tenho conforto, posso sair, posso voltar,
Posso comprar; posso.
Por que eu deveria me preocupar com a humanidade
Se não faço parte de seus problemas e suas tramoias?
Por que eu, que não roubo, não mato, não corto árvores, não maltrato a ninguém,
Trabalho dignamente, deveria me preocupar?

Baixos salários, corrupção, ignorância, hipocrisia, fingimento, aceitação, conformação, inércia.
Estou confortável do modo que estou.
Eu tenho religião, cumpro com minhas obrigações para com Deus
E para com o Estado, pago impostos, não me atraso, se devo nunca deixo de pagar,
Jogo lixo no lixo, não faço queimadas, voto já que tenho que votar.
Preocupar-me?
Por que eu deveria?

Estou tão confortável vendo minhas novelas, lendo meus livros de fantasia,
Repetindo sempre a mesma frase todo dia diante do noticiário: que horror...
Até minha indignação está ficando amena.
Mas sinto-me tão confortável.
Se quiserem tirar-me a voz, que tirem, pois há muito tempo deixei de gritar.
Se quiserem pisar em minhas flores e matarem meu cão, façam-no,
Já cimentei meu jardim e acorrentei meu cão.
Se quiserem tirar tudo de mim, que façam,
Só não me tirem a poltrona, as novelas, o cigarro que me relaxa.
Não me tirem do conforto.
Quanto a humanidade?
Não posso impedir o mundo de acabar.
Quanto ao chão que piso?
Verde e amarelo, toca o som aí que eu quero é sambar!!!!!
Por Elayne Amorim

Um comentário:

Carlos Brunno S. Barbosa disse...

Sei que este não é o tipo de poema que você gosta de escrever (acho que ninguém gosta de fazer poema social, pois é triste saber que ele eterniza denúncias que permanecem em nosso hostil ambiente sócio-político), mas destaco a beleza de seu poema, com ironia na medida certa e denúncia liricamente rica e social.