Ah, que minha sensibilidade seja abalada, mas
não retorcida. Que meu coração não se endureça perante a ilógica maldade que
parece nunca ter fim neste mundo. Que eu seja persistente, que lute pelos meus
ideais, mas que não me torne perversa. Que eu possa acreditar naquilo que os
olhos comuns não conseguem ver. Que meu coração possa sentir: isso sempre. Sentir
amor. Sentir compaixão. Sentir perdão. Que a rotina não me torne frívola, que a
ignorância alheia não alimente minha própria ignorância. Que meu espírito livre
não se aprisione ao medo, ao cansaço, ao conforto. Que meus sonhos quebrados
tornem-se mosaicos de outros sonhos. Que eu compreenda que os outros também
sentem e têm todo direito de pensarem diferente de mim. Que eu acredite que
tudo muda. Que o tempo – palavra chave – me molde conforme as florestas e os
mares. Que eu me permita me livrar das culpas. Que eu me permita aprender,
mesmo sentindo dor. Não é sempre que a poesia bate: ela também possui seus
momentos de silêncio. Que eu possa enxergar a bondade mesmo enquanto a
destruição e o mal encenem mais ao palco. Eu não sei o que é ser humano, mas que
todos os dias possua alguma epifania. Que eu me dê ao direito de descansar. De não
querer. De querer. De não poder. De poder. Ah, que eu não deixe de acreditar no
amor porque em tudo o que toco ele deve estar presente ou nada do que fizer
valerá a pena. Que eu não endureça. Que eu não apodreça. Que eu não me torne
ríspida, apesar de. Que eu saiba distinguir o fútil do precioso. Que meus
gestos não sejam interesseiros. Que minha sensibilidade traga o melhor da minha
essência. Que eu não esqueça quem sou. Que eu não me esqueça de agradecer. Que eu
não me cale diante de uma injustiça. Que eu não seja implacável com a dor
alheia. Que eu não julgue. Que eu não finja que está tudo bem quando não
estiver. Que eu não guarde ressentimentos. Que eu vislumbre sempre o agora como
um presente. Que eu compreenda que tudo na vida possui ciclos, como a própria
natureza tenta nos ensinar. Que minha parte animal não me deixe de fazer olhar
pelos outros animais. Que minha parte humana não me deixe ser medíocre com os
outros seres humanos.
Que meu espírito livre seja sempre livre...
que eu não me aprisione na dureza que este mundo parece exigir de nós. Não pertencemos
a este mundo – apenas estamos; quem sabe, para sermos melhores, para termos
possibilidades... Nada/ninguém nos pertence além de nossa própria essência que
apenas passa por mais esta experiência...
por Elayne Amorim
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